Morreu nesta segunda-feira, 21/4, aos 88 anos, o argentino Jorge Mario Bergoglio, o Papa Francisco. De acordo com a informação divulgada pelo Vaticano, ele faleceu devido a um AVC e a insuficiência cardíaca. Francisco fez sua última aparição pública no dia 20, Domingo de Páscoa, durante as celebrações da data na Praça de São Pedro, no Vaticano. O pontífice se recuperava após um quadro respiratório grave, que o deixou 37 dias no hospital, entre fevereiro e março deste ano.
O comunicado oficial do Vaticano disse: “Queridos irmãos e irmãs, com profunda tristeza devo anunciar a morte de nosso Santo Padre Francisco. Às 7h35 desta manhã, o Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja”
Como é tradição, o funeral do líder da Igreja Católica começa na Basílica de São Pedro. O corpo ficará exposto para visitação e oração dos fiéis, a partir de sábado. O funeral termina com a missa de corpo presente, na Praça de São Pedro.
O Palácio do Planalto informou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a primeira-dama Janja irão ao funeral de Francisco em Roma.
Primeiro Papa latino-americano
Francisco foi eleito em 2013, aos 76 anos, após a renúncia de Bento XVI. Sua nomeação como 266º Papa da Igreja Católica foi um marco histórico. Nascido em 17 de dezembro de 1936 em Buenos Aires, ele se tornou o primeiro pontífice que nasceu e viveu na América do Sul. Bergoglio também foi o primeiro Papa selecionado entre os religiosos da Ordem dos Jesuítas.
O Papa era formado em química pela Universidad de Buenos Aires. Em 1958, ingressou na Ordem dos jesuítas e, em seguida, licenciou-se em Filosofia pela Faculdade de São Miguel. Posteriormente fez doutorado em Teologia em Freiburg, na Alemanha. Foi ordenado sacerdote em 1969. Após um período de apostolado na Argentina, retornou para a Faculdade de São Miguel como professor de teologia em 1980 e lá permaneceu até 1986. Em 1992, foi nomeado bispo titular de Auca e bispo auxiliar de Buenos Aires. Já em 1998, tornou-se arcebispo da capital argentina e em 2001 foi nomeado cardeal pelo papa João Paulo II. A se tornar o primeiro Papa a reinar sob o nome de Francisco, ele expressou seu desejo por uma igreja mais simples, mais pobre e mais próxima dos sofredores e humildes.
Uma visão mais ampla da Igreja
Ivan Esperança Rocha, professor de história oriental antiga e especialista em história das religiões da Faculdade de Ciências e Letras da Unesp, câmpus de Assis, destaca que o papado de Francisco foi marcado por características muito peculiares.
Ele ressalta que o falecido Papa adotava uma visão do cargo que ia além da liderança da Igreja. Francisco protagonizou diversas iniciativas de caráter ecumênico e multinacional, buscando aproximar todos os povos, a despeito de quaisquer que sejam as suas crenças, os seus valores religiosos e os seus ideários.
“A preocupação dele não era estar à frente apenas da Igreja Católica, mas abrangia a humanidade. Esse é o aspecto que o distingue. Outro elemento é o seu compromisso com a justiça social, com a equidade, com a defesa dos pobres, dos marginalizados. Ele se engajou em uma questão bastante quente neste momento, que é a questão dos imigrantes. E, particularmente, com a posição assumida por determinados grupos neste momento a respeito dos imigrantes”, diz Rocha. No front interno, ele se esforçou por reformar a Igreja, buscando modernizá-la e tornando-a um pouco mais acessível a todos.
Uma particularidade deste pontificado foi o recurso, com muita frequência e com muita intensidade, às redes sociais, a fim de se comunicar não apenas com os católicos, mas com grupos humanos e povos de todo o planeta. Esse traço de engajamento com o mundo contemporâneo foi outro diferencial. “Francisco falava sobre ecologia integral e a sustentabilidade, dizia que a justiça social é alavancada também pela criação de um mundo ecologicamente protegido e garantido”, diz Rocha.
Ele também se posicionava quanto aos grandes conflitos políticos que eclodiram durante seu pontificado. “Ele foi o Papa da Igreja Católica, mas buscou promover o entendimento entre diferentes culturas e religiões de qualquer recanto do globo. Fez a defesa da paz mundial e de uma solução, digamos assim, mais veloz dos conflitos. Particularmente estes, dos últimos tempos, marcados pelo conflito entre judeus e palestinos e entre Rússia e Ucrânia. Ele, que durante a sua presença na Argentina, experienciou também conflitos complicados, que todos nós conhecemos”, diz.
O Papa também enfatizou o valor da família como núcleo da sociedade. Dentro da família, destacou o papel da juventude, e incentivou sua participação ativa na igreja. Também destacou o papel da mulher, na Igreja e na sociedade como um todo. E defendeu que as mulheres pudessem ocupar mais espaços e alcançar maior participação, em todos os segmentos da sociedade moderna, e também dentro da própria Igreja. Neste sentido, durante seu pontificado foram criadas várias instâncias em que as mulheres se fizeram muito presentes.
Papa influenciou outros líderes religiosos
Para o historiador, o grande legado de Francisco é justamente a reflexão sobre o papel da Igreja no mundo moderno.”Essa é a grande questão. Ele não estava preocupado com a conversão de toda a população mundial para o cristianismo, mas sim com a conversão de toda a humanidade aos valores defendidos pelo cristianismo, que podem ser compreendidos por qualquer criança do planeta. Nesse sentido, ele rompeu com um ideário de fechamento e defende um ideário de abertura. No verdadeiro sentido de humanidade, e não de cristandade”, analisa.
“E disse também às religiões qual é o seu papel. E é por isso que estamos vendo muitos líderes religiosos, de diferentes proveniências, dizendo-se profundamente alinhados com o pensamento do Papa Francisco.”
Para Rocha, o legado do papado de Francisco está relacionado a esta guiança da igreja como um segmento que deve se alinhar a todos os segmentos que vão defender uma vida mais digna. “Não apenas para católicos, ou para qualquer outro grupo humano específico, como nós estamos vendo neste momento. Acho que este é o grande valor que o Papa Francisco deixa para todos nós. E acredito que esse valor deve ser levado em consideração no conclave que será realizado proximamente, como critério para a indicação daquele que dará continuidade a essas ideias dentro do trabalho pontifical”, diz.
Para ouvir a íntegra da entrevista de Ivan Esperança Rocha, clique abaixo.